terça-feira, 19 de abril de 2011

(SP) Empresário comenta o caótico cenário das operações urbanas de transporte em SP

O Portal Transporta Brasil traz uma entrevista exclusiva com Antônio Archilha, diretor da Argius Transportes, especialista em transportes urbanos na Região Metropolitana de São Paulo.

Portal Transporta Brasil: Esta tendência de restringir os caminhões em diversas cidades brasileiras se justifica do ponto de vista técnico para melhorara a circulação do trânsito?

Antônio Archilha: Do ponto de vista de melhoria do trânsito não se justifica. Temos o exemplo de São Paulo que comprova isso. Tínhamos uma Zona de Máxima Restrição à Circulação (ZMRC) de 11 quilômetros quadrados, que passou para 24 e agora é de 100 quilômetros quadrados. Temos o rodízio para os caminhões, que também foi implementado por esta administração. Tudo isso foi feito com a promessa de que o trânsito melhoraria. Isso não aconteceu. As empresas de transporte foram sacrificadas com as restrições, a proibição do VUC, o rodízio das placas par e ímpar e tantas outras proibições. Uma cidade que hoje emplaca cerca de 1000 veículos por dia, por volta de 20 mil por mês e 240 mil por ano e que tem um espaço viário que não cresce nesta proporção, não pode colocar o caminhão como vilão do trânsito. Esta responsabilidade está recaindo sobre os ombros do transporte de cargas.

Portal Transporta Brasil: Como isso traz custos para as empresas de transporte?

Antônio Archilha: O aumento de custos foi muito grande. Tivemos que tirar de circulação os veículos de porte médio e grande, compramos veículos melhores e enchemos as ruas com estes veículos menores. O grande problema é que os principais recebedores de cargas, como os grandes shopping centers, estão dentro da área de restrição e o comércio não recebe mercadorias à noite. Este recebimento é feito somente no horário comercial, quando as restrições estão em vigor. Ora, se a cidade não pode parar, se o comércio não pode ficar desabastecido, as transportadoras foram obrigadas a adquirir toda uma nova frota de veículos menores. Temos que cumprir nosso papel, assumindo estes custos, mesmo com a imposição destas restrições.

Portal Transporta Brasil: A restrição é mais um personagem na indústria das multas. Como isso impacta nas operações de uma transportadora?

Antônio Archilha: O impacto é grande. Tivemos que criar um departamento especializado para ficar responsável por toda a frota e a gestão das multas em razão de rodízio e horário de circulação. A cidade pára por qualquer detalhe. Um acidente de moto, uma chuva, uma ocorrência em uma via expressa. Isso já basta para travar a cidade e, por consequência, a operação de uma transportadora. Tudo isso dificulta o cumprimento do horário de circulação dos caminhões. Eu acho que estas 100 mil multas das restrições que foram divulgadas recentemente são um custo que infelizmente temos que arcar, sem poder repassar pra ninguém. A proibição dos caminhões na Marginal Pinheiros e na Avenida dos Bandeirantes dificultou nosso trabalho ainda mais. A região Sul de São Paulo concentra um número grande de indústrias, que precisam ser abastecidas e precisam também escoar seus produtos. Com as restrições, a operação de uma transportadora fica difícil demais. O que tem acontecido é que o setor de transportes, ciente de sua missão de abastecer a cidade e atender os clientes, às vezes é obrigado a arcar com esta situação descumprindo a lei contra a nossa vontade. Isso tem acontecido com frequência. O cliente precisa receber a carga e não dá abertura às transportadoras para a realização da entrega noturna. Temos arcado com a despesa e a punição dessas multas.

Portal Transporta Brasil: E as dificuldades de mobilidade? Como este cenário se desdobra para um futuro próximo? São Paulo vai parar?

Antônio Archilha: São Paulo já está parando. Estas medidas das restrições até ajudaram, mas são medidas paliativas. É preciso tomar medidas mais rigorosas e firmes em relação ao transporte coletivo. A cidade está parando. Em dois ou três anos teremos dificuldades seriíssimas de circulação. Algumas medidas têm que ser tomadas. A primeira coisa é investir em transporte coletivo com urgência. Pedágio urbano é outra opção, mas eu acho que este dinheiro deveria ser investido no transporte coletivo urbano, mas sabemos que isso não acontecerá. A CET arrecada hoje milhões e milhões em multas, mas o que se vê são investimentos em fiscalização eletrônica, e não na orientação aos motoristas. O papel da CET é simplesmente multar, penalizar o motorista. Acredito que até 2012 ou 2013 São Paulo vai parar. Hoje, nem temos mais os horários de pico no trânsito. O pico é o dia inteiro. Ninguém deixa de fazer suas coisas em razão do rodízio. As pessoas têm um carro extra. A arrecadação das multas deveria ir para a infraestrutura urbana.

Portal Transporta Brasil: No exterior, a tendência é contrária, privilegiando o transporte coletivo. Caminhão é transporte coletivo também?

Antônio Archilha: Claro que sim. No exterior, o metrô e o transporte coletivo é prioridade. Há cidades muito menores que São Paulo que têm o dobro ou o triplo da malha de metrô que temos. Se a nossa cidade tomar uma iniciativa séria para incentivar o transporte coletivo, o caminhão poderá cumprir seu papel também de transporte coletivo, abastecendo a vida das pessoas. Os produtos têm que chegar. Vemos por aí carros levando somente uma pessoa, ocupando espaço de estacionamento nas vias e entupindo as ruas. Temos em São Paulo, no Centro, inúmeros imóveis abandonados, que poderiam ser transformados em estacionamentos. A Zona Azul, que arrecada dinheiro para o município, toma espaço nas ruas. As autoridades estão interessadas em arrecadar, e não em solucionar problemas.

Portal Transporta Brasil: É possível sobretaxar os clientes por causa das dificuldades de mobilidade?

Antônio Archilha: Não. É muito difícil. Há algum tempo atrás, as entidades representativas das empresas de transporte em São Paulo criaram uma taxa de dificuldade nas entregas, mas esta taxa de difícil repasse ao cliente, que sabe da dificuldade, mas as transportadoras têm arcado com este custo. Passamos com compra de frota, com a aquisição de veículos menores, contratação de mais colaboradores, para poder suprir as tripulações em uma frota mais numerosa e até diminuímos a quantidade de entregas por causa das restrições. Estes são custos que estão sendo absorvidos pelas transportadoras, lamentavelmente. Não vejo esta possibilidade de repasse e não vejo nenhuma ação por parte das entidades do setor para buscar soluções para o abastecimento junto à Prefeitura. Nossas entidades do transporte de cargas não estão ajudando as empresas a fazer um trabalho para evitar que São Paulo fique desabastecida. Nossa cidade merece uma atenção especial. Estamos nos aproximando agora do Dia das Mães, que é a segunda data mais importante para o comércio no ano, e logo estaremos no final do ano, que é aquela loucura, com forte demanda de produtos e a vinda de milhares de pessoas à capital para fazer compras. No ano passado a época do Natal foi um grande sufoco para as transportadoras e em 2011 e 2012 a tendência é que isso piore se algumas atitudes mais rigorosas não forem tomadas. Nosso setor está carente, as nossas entidades precisam trabalhar mais em conjunto com a prefeitura para buscar alternativas e não permitam que a prefeitura venha impor medidas que não deveriam nem estar em vigor.

FONTE: TRANSPORTA BRASIL

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